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PALAVRAS27

Water Music, de Hândel

Sobre o rio descem 
cordas e madeiras 
a remos de metais 

É como o sol nas águas , no arvoredo verde 
que as águas reverdece de verdura e sombra. 

Crepitam trompas e destilam flautas 
na crespa ondulação que as proas tangem 
e morre em margens de oboé e bombo, 
cadenciando o choque das remadas de ouro. 

A brisa flui 
serena e fina 
em cabeleiras 
e em rendas que 
ondulam 
risonhas e solenes 
sobre os bordados esparzidos, prata 
que dança e salta enquanto 
as barcas se meneiam 
na transparência opaca das águas como céu 
azul que a tarde por silêncios tece 
em majestade eterna e momentânea 
dos astros em curso. 

Habitados só 
por deuses e pastores 
gerados na saudade 
da simples harmonia 
contrapontada na invenção da vida, 
os planetas pisam abstratas órbitas 
à luz de um sol de que recebem foco. 
E as barcas descem temporais o rio 
de cujas águas são flutuante forma 
da eternidade do destino ignoto. 

Com pompas e sorrisos 
os instrumentos tocam 
virilmente lânguidos 
a circunstância de uma festa aquática: 
secreta e oculta uma melancolia 
dessas grandezas que ordenadas fluem 
a remos de metais no efémero perene 
de que o eterno faz a sucessão de instantes. 

Os últimos acordes como vénias passam. 
O sol dardeja sobre as frondes. Tronos 
dourados se dissolvem no reflexo das águas 
que a música prolonga em gloriosas tardes. 

E a glória se dilui de etéreas trompas 
que as cordas acompanham sobre os rios 
de música tão régia que a existência vive 
o ato de pensar na ordem recriada. 

in “Arte de Música” | 1968

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